O primeiro trabalho solo da cantora, compositora e
excepcional poetisa Ligia Saavedra, sintetiza neste álbum a experiência e exuberância
de seu talento, gravado após longos anos de silêncio da artista.
Nele Lígia desfila a beleza, a vida e a cultura da região norte do país, e canta
também os amores e a sabedoria de quem viveu intensamente cada momento.
Com um repertório bastante diversificado Lígia faz
uma salada rítmica, que vai dos elementos musicais da cultura paraense, ou
melhor, nortista, a sambas canção, e MPB POP.
Três coisas são surpreendentes neste álbum, a
bela voz de Lígia, muito bem trabalhada e de uma ternura encantadora; sua
expressiva interpretação carregada de emoção e sinceridade, e; as letras, de um
lirismo entorpecedor, a poesia de Lígia Saavedra é imponente, de tirar o chapéu.
O disco contou com a participação de artistas
conhecidos da cena cultural paraense, como Pedrinho Cavalleiro e Alcyr
Guimarães, onde Lígia Saavedra goza de grande prestigio e tem o seu lugar de
destaque.
A faixa título “Além dos muros”, da autoria de
Pedrinho Cavalleiro e Jorge Andrande revela as intenções do álbum: “Tomara que essa
espera passe calma na janela e frutifique grão e Hera além dos muros por sobre
os rumos que o meu coração sonhar.”, aqui a interprete, de longa carreira,
renasce em seu primeiro registro solo, fala da espera, que na verdade é uma
conquista, de sonhos e esperança, de levar sua voz e seu talento além dos
muros, na verdade a imensa muralha que a indústria cultural ostenta para barrar
artistas que só podem contar com o
dom extraordinário que Deus lhe deu.
“Tem dó”, é a faixa mais impressionante,
principalmente pelo belo arranjo percussivo e de cordas, o violão expressivo e
cheio de swing dá tons pop a bela canção e o timbre de voz de Alcyr Guimarães,
que participa da faixa, nos remete a um grande nome da musica popular
brasileira: Chico Buarque de Holanda. A canção traduz o cotidiano de Belém do
Pará, faz referência a lugares e costumes da cidade, expressões linguísticas e
grandes vultos da cultura paraense.
“Cristais de saudades” é a canção mais pessoal do
álbum, deixemos que a própria Ligia fale sobre a mesma:“Quando perdi meu filho,
em janeiro do ano passado, já tinha o
compromisso de gravar um CD, agora pronto chamado ‘Além dos Muros’. Após seu
falecimento as pouquíssimas palavras que conseguir escrever falam de dor e de
saudade com muito ressentimento e tristeza, mas em ‘Cristais de saudades’
acendo a esperança do reencontro e relembro aquele lindo sorriso que tantas
vezes me fez feliz. ‘Cristais de Saudades’, agora uma linda música composta em
parceria com Pedrinho Cavallero, está no CD “Além dos Muros”, eternizando o meu
sentimento e a necessidade que sinto de gritar para o mundo: ‘Filho, jamais te
esquecerei.’”
Também de Pedrinho Cavallero e Jorge Andrade,
‘Cabano’ faz referencia a cabanagem, revolta popular, no período do Brasil
Imperial, ocorrida na Província de Grão-Pará.
Em “Tuas mãos”, canção em parceria com Marcia Yamada
e Pedrinho Cavallero, acompanhada por um envolvente solo de saxofone, Ligia
esbanja, com bom gosto e longe da intenção de ser vulgar, sensualidade e
erotismo: “Tuas mãos é o que me fazem sentir, estremeço só de pensar, é como
desde o início tivesse um mapa do meu corpo a te guiar.”
Na faixa “Me permito”, Lígia faz uma ode ao livre
arbítrio, uma canção de desprendimento, para aqueles que vivem a vida
intensamente, e, não perde a oportunidade de fazer uma declaração de amor à
própria existência.
Mais lirismo, romantismo e a memória afetiva
popular desfilam nas demais faixas do disco, fazendo deste álbum uma obra prima
que mereceu inclusive a atenção da crítica internacional de Wilbert Sostre da
JazzRewiews.
Um disco de estreia, mas marcado pela experiência
de uma veterana, talentosa e destemida, que soube impor o seu valor artístico e
conquistar seu lugar ao sol, junto aos grandes nomes da musica do norte do
Brasil.
Entre feliz e emocionada te agradeço, mais uma vez pela postagem, amigo Penha.
ResponderExcluirTudo o que você escreve acima sobre o "Além dos Muros" me fala à alma, pois ele foi gravado enquanto o meu coração sangrava e a emoção falou mais alto.
Muito obrigada!